• |
  • |
  • |

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Loucura



"Loucura textual é a loucura que é implantada pelo escritor. Mas quem disse que ele também não é contagiado com isso, tornando as letras tortas em seu pensamento oblíquo, e se tornando... insano."






A monstruosidade começou quando eu estava na Paullinne, alimentando os peixes que ali escoravam-se. Dei esse nome ao barco pois de certo de modo, eu me sentia sozinho. Um velho de sessenta e dois anos, viúvo, sem filhos, afundado em dívidas. O monstruoso fato que me refiro foi de ver o cardume ir embora e com a maré ver chegar uma garrafa com inúmeros papéis enrolados dentro. Bateu no barco e ouvir o tintilar de vidro trincando, e por uma sorte, que agora acredito ser uma maldição, foi um trincar externo, não permitindo assim a água adentrar.
Foi de imediato; saltei da rede dentro do único cômodo de um barquinho de doze metros, bati minha cabeça no batente superior da entrada deste quarto, e fui de encontro àquele som.
Uma garrafinha tosca, acredito que antes era a casa de um bom rum, e agora estava estragada e velha. Assim como eu.
Me chamo Tobbey Helverdy e minha esposa morreu em um acidente aéreo. Na verdade, ela entrou em um avião, e nunca mais apareceu. O avião não pousou em Pequim. O avião sumiu no ar. Deve ter uns cem metros de tamanho e ninguém notou pra onde ele foi.
Por algum motivo em que segurei essa garrafa, eu lembrei de tal memória, antes incógnita nas profundezas de minha mente.
Isso foi há 12 anos, em 2014. - De lá pra cá me tornei pescador e tenho pegado muitas espécies; desde enormes lulas a grandiosos crustáceos.

Tirei com cuidado a rolha da garrafa. - Peguei um papel e era recôndito o que percebi, que a resma estava enumerada do 1 ao 8.
Pus-me a ler aquelas opróbias palavras.

A primeira folha dizia;
" o mundo em que vives é desonroso demais, oh pescador que no mar se afoga, e na garganta sente o veneno da cobra do que a vida tirou e não devolverá mais". 
Me arrepiei. Aquelas palavras... Eram.... Pra mim?
Li a segunda.
e dizia;
"O rascunho do passado pode ser o portal para o futuro, assim como a semente de um fruto que se planta no mais desértico espaço, se tornará doce e maduro".

A vida não faz sentido mesmo! Eu levanto minhas mãos aos céus e agradeço a Deus. Oh, rapaz... Que fabuloso achado.
Não me contive. Tenho que ler outra.

"Não se engane. O vício é um desejo vítreo e o desejo vítreo pode ser ilícito, e o ilícito pode ter continuidade singular ou seguir um caminho ambíguo. As rimas de um palhaço sem fala? Ou um poema pobre de um homem que só viveu desgraça?"
Eu vivi desgraça. Meu Deus essas palavras estão, por algum motivo, me fazendo pular do barco, aproveitar a água e o Sol e limpar a alma.
Mas a terceira folha disse:
"Você consegue acompanhar o tempo? Você quer mudar de vida agora? Ser algo, ter algo... Vai em frente, tente! Olhe no fundo da sua alma. Mas não esqueça de esquecer o escuro que há na sua mente."
Eu tentei. Naquela noite, quando você ouve alguns peixes que vão até a superfície somente para atirar água da boca e fazer um som semelhante ao chocalho da cobra, eu tive um sonho ruim. Sonhei com o mundo se tornando um papel, se dobrando em uma A4 em seus quatro lados, e se remontando em um origami sem parâmetros. Um desenho de um soldado sentado, sem olhos, sem braços, mas eu sabia que era um soldado. Ou algo semelhante a isso.
De repente se tornava uma mão. Apontava pra parede e meu rosto, como se fosse uma câmera, virava pra ela. Eu via um buraco negro em formato de vórtex, sugando tudo ao seu redor. A particularidade estava no que havia dentro dele; Planetas, estrelas, luas, depois sóis, e por último um conjunto de constelações inteiras.
Aquela imagem dentro do círculo que me proporcionava uma visão panorâmica dessas anomalias, também desfigurava-se em outras imagens. Como as pessoas; presidentes da república de vários países, rostos desconhecidos, familiares - todos esses com seus rostos envoltos em uma névoa cinzenta. Ficava mudando e mudando.... Algumas eram névoas rubras e/ou vermelhas. Eu não entendi bem isso.
Mas foi aí que fui guinado para fora de minha anomalia sonífera. - Eu fui surpreendido por uma luz onde eu não sabia a princípio de onde vinha. Apenas estava lá.
Depois de limpar os olhos na água do mar eu vi;
A água do mar estava verde e os peixes estavam mortos porém brilhantes. Vi auroras boreais acima de mim formando nomes, uns que me recordo bem; minha esposa tinha bastante nomes para dar pra filhos quando tínhamos vinte e seis, mas depois de saber que não podia parir, nomeou bonecas que comprou - foram esses nomes que vi no céu. Melissa, Johanna, Elisabeth,  Abigail.
Seres abissais nadavam ao redor do barco, aproveitando-se do aclaramento daquela fonte de luz espontânea para se mostrar.
Um peixe colossal com uma lanterna brilhado em um vermelho vivo me alertou... Aqueles eram agentes da loucura... Nada estava ali. E então a imagem piscava e voltava, desligando e ligando. Uma hora estavam e depois não mais.
Acordei na minha rede novamente, mijado. Senti vergonha. Mas na minha idade.. hã... isso bem que é normal.
Um velho desfraldado.
Outra luz surgia, em um tom azul idílio - esse projetava um filme nas paredes internas do quartos - meu casamento...
Ela estava tão linda usando o branco com decote nos peitos. Sentia-se acanhada... Não conseguia imaginar aquilo, achava vulgar. Tinha vergonha dos seios, das pernas, e eram as partes mais formosas de seu corpo.
Como ela estava linda.

Acordei novamente. Não estava mijado mais. E meu relógio dizia que já se passavam três dias desde quando peguei aquela garrafa.
Achei que ele tinha pifado.
Lasquei uma pedra que usava como peso pra portinha do quarto, fiz duas menores. Criei fogo com elas e me decidi ler aquelas malditas páginas.
Entretanto quando abri... só tinham duas páginas...
Eu li a primeira e o desespero começou;

- ALZTAMNEK MCNAHAZ ZHULT MANHUR ALDHAR - meus olhos se reviram, voltam, e senti meu corpo ser sugado em direção ao céu. Um feixe de luz acima gritava de tão brilhante e eu não conseguia ver seu final. - MANHUR AHAHAMANAHUR BRIKCHUMA ELT AGHRU - Eu estava cercado por seres violetas. Não tinham olhos, senão rascunhos fundos de onde eles e a boca e nariz estariam.
Produziam sons para se comunicar, como os pássaros fazem. Percebi que decidiram entre si, o que iam fazer comigo.
Primeiro apertaram meu braço. Depois o arrancaram e eu não senti dor. Estava anestesiado, apenas a frieza de onde era pra estar meu braço se fazia presente.
Pegaram o braço sem vida e aproximaram do seus corpos. Sugado como osmose. Eles se alimentavam. Se alimentavam de mim.
E a única coisa que eu pensava era em ler a última página. Tentei, com meu olhar bêbado, observar a sala ao redor e vi meu barco há alguns metros de mim. E mais deles estavam a se juntar com os que faziam de mim sua refeição. Um deles veio com o papel e apontou pro meu rosto e me indicou uma parede à minha direita. Olhei.
Era a última folha, e nela havia um desenho e umas palavras que consegui ler.

Pesquisa de 1992 - parceria humano-alien - como temperar um ser humano usando dor, medo, frustração e transtornos mentais.

.
.
. Arrancaram o coração do homem e a imagem se fechou, como quem desliga uma Tv. -
.
.
.
.
.
.
.
.
.
.


2026 - Notícias locais a respeito da anomalia encontrada no lago River;
Um homem foi encontrado nesta terça feira, na verdade, parte do que teria sido esse homem. Uma escultura modelada no papel de um ser agachado com as mãos na cabeça. E onde está o ar da questão? Bem, apenas a cabeça está na estrutura. O resto é preenchido com papel, algodão e a razão de não ter caído, é que os ossos ainda estão lá, segurando.
E o estranho;
O rosto do homem está com uma expressão misturada de medo, dor e amor. E como sabemos?
Bem... 
Ele meio que está...








0 comentários:

Postar um comentário

 

Rust Hill Copyright © 2010 | Designed by: compartidisimo