"O clima de colegial esconde mais do que parece, entre armários estudantis, atrás das cadeiras, atrás do quadro negro, há um mistério..."
'Manhã calorosa na cidade pacata de Four City e vai aumentar de acordo com a nossa...'
- Junior desliga o rádio, vai se atrasar para a escola...
- Já vou mamãe... Estou esperando o resultado dos jogos de verão, a equipe do colégio pode estar colocada entre os dez melhores e nós poderemos ser classificados para competir contra a seleção do ano que vem. Ia ser o máximo...
- Mas enquanto não é... - fez uma pausa para tossir a fumaça do Marlboro que estava na estante há meses - Se arrume e vá a escola, tudo que não quero é ter um filho desviado dos estudos e se tornar esses vagabundos desses que encontro pelo mundo jogado, aqui nesta rua há vários... - faz outra pausa para esbaforir uma fumaça tão densa que fez Andy levar o rádio para o quarto, e deixou a cozinha enfumaçada.
''Colégio Ivysbourne, classificado. Colégio Marin Bourbon, desclassificado. Colégio Alister Betany, classificado. Colégio Randy Forlowoods..."- a rádio perde a sintonia e a voz fica destorcida a ponto de não entender o que o apresentador disse. -
- Ah não logo agora, era meu colégio... Mas que saco!!!
Andy dá umas batidas na parte superior, e apela ao tentando usar uma lã de aço na ponta de uma das antenas, mas sem sucesso. Vira as costas e vai ao quarto quase fechando a porta, quando ele escuta uma voz sussurrando de fora da janela, uma voz juvenil uns dois anos mais velho que Andy na faixa dos dezesseis...
- Aê oh manezão, vamos dar o fora daqui, estou precisando relaxar um pouco quer vir comigo?
- E eu tenho opção?
- Tem a opção de ser bicha e ficar batendo punheta o dia todo na merda do quarto olhando os pôsteres dos "viadõesdecabelogrande" - falou dessa maneira como se fossem uma só palavra - Vamos cara estou com umas coisas que peguei do meu pai.
- Você quer dizer "coisas que roubei do meu pai", não é mesmo?
- Quem se importa, não é roubo quando não dá por falta, e do que eu trouxe, ele têm muitos... Deixa de ser incubado vem logo.
- Eu disse a mamãe que eu ia ao colégio, na verdade , ela me cobrou isso hoje sem eu precisar falar.
- Também disse que foi um cuzão em não aceitar o beijo da Alice?
Andy já estava sentado na janela com a mochila nas costas para disfarçar que iria mesmo ao colégio.
- Quem aquela desdentada da sétima série? ah não, não , ela queria pegar você cara, hahaha!!!
Tony puxa o pé de Andy para fora da sua casa, e os dois caminham pela avenida principal que dava direto ao riacho, cruzando a cidade de Four city até os canais de esgoto da cidade vizinha. Os dois riam como da última vez em que estiveram em um show de piadas do "palhaço cabeça de balde", não pelas suas piadas mas sim pelas tentativas falhas de fazerem todos da platéia rirem com suas quedas e números patéticos, e também por que Tony tirava sarro das roupas do palhaço dizendo: "Aê Andy, ele pegou a calça emprestada da tua mãe" ou também " Ele não é seu pai Andy? têm o mesmo jeito de cuzão que você hahaha!". Geralmente Andrew não sorria sobre algo relacionado ao seu pai, o único que conseguira esse feito foi Antonny, e por isso os dois eram melhores amigos desde então.
- Se liga cara, meu pai teve uma cliente que mexia com espiritismo ou macumba sei lá, e deixou isso lá no escritório de advocacia dentro de uma bolsa, se liga só...
Andy gira a cabeça para a esquerda tentando ler o que havia escrito na parte superior de uma tábua de madeira, O-U-I-J-A, mas que droga é essa?
Uma placa quadrada de madeira bem envelhecida, surrada pelo o tempo ou por mal uso, talvez.
Uma placa quadrada de madeira bem envelhecida, surrada pelo o tempo ou por mal uso, talvez.
- Ah sei lá, sabe o que significa ouija?
- Não, sem piadas com minha mãe por favor...
- Significa "sua mãe é uma vagabunda em mandarim", não é brincadeira, cara...
- Mas você é uma bicha mesmo, hein?
- Cara eu não sei como usar isso direito, mas eu dei uma pesquisada e descobri que você se comunica com os manos do outro mundo, são coisas de necromancia, vamos tentar deve ser legal.
- Tony você só dá mancada cara, mas que merda hein, essa porra não vai fazer nada, faltei aula para jogar o tempo fora e relaxar, e você me aparece com as mentiras de espírito e bruxaria, ah cara me poupe...
- Eu vou tentar contactar o zelador Cliff, aquele do colégio que desmaiou enquanto limpava as vidraças da nossa sala, e sabe-se lá deus como ele ficou com o pescoço entre a dobradiça da janela, e você sabe não é? - os pássaros sacudiam uma antiga árvore próximo de onde eles estavam sentados, e os dois observam, Antonny prossegue - a janela fez "crack", e a sala ficou banhada de sangue e a parede da fachada do colégio ficaram cobertas também, até parecia dia de Halloween. Os diretores suspenderam as aulas durante toda a semana, e a nossa sala só foi liberada esse ano, ficamos com uma sala do ensino médio enquanto não terminava o ano. Dizem que ainda sente-se o cheiro do sangue do velho, mas isso é outra história deve ser o perfume com essência de porco da professora de biologia. Que hilário cara...
- Sempre com piadinhas... Eu não sabia sobre ele.
- Ah sim sim, isso foi antes de você virar homem e ir lá para o colégio. Eu estudava lá, na verdade sempre estudei...
- Isso eu sabia.
- E aí vamos tentar?
- Tenho alguma opção?
Tony imita com uma voz fina em um tom idiota:
- "Tenho alguma opção"?
- "Tenho alguma opção"?
- Primeiramente eu quero que você se foda, vamos logo ou vou começar a te bater!
- COM UM PODER A MIM CONCEDIDO EU INVOCO VOCÊ!
- Deixa de ser otário, virou padre? e não aqueles exorcistas e sim aqueles que fazem casamento.
- É brincadeira, eu vou ler as instruções aqui atrás, está tudo escrito de forma estranha.
- Tenta esfregar que nem a lâmpada do Aladdin.
- Vou esfregar na sua bunda, que nem o cacete do Tony, ops meu.
- Mais uma eu vou embora...
- Cara então não fala besteira. Bem vamos lá está tudo em negrito e está quase ilegível...
- Me dá isso deixa que eu leio!
Antonny tira da bolsa uma última peça que viera com o tabuleiro, uma pedra cinza em forma de coração com um buraco no meio.
- Que troço sinistro, está tudo em alemão...
- Como você sabe?
- Morei lá com meu pai até ele morrer, depois vim morar com minha mãe.
- E então, o que está escrito?
- "Für die Kräfte, die in der Finsternis herrschen, und die frühen Morgenstunden, der Macht des Satans, ich behaupte, seine Macht über mich jetzt, und ich möchte mich jetzt kommen. Und in Besitz nehmen meinen Körper als Kanal zur anderen Welt ".
- Pode me dizer o que significa na minha língua, por favor? - diz em um tom irônico e pouco irritado
- Diz:"Pelas forças que prevalecem nas trevas, e as primeiras horas da manhã, no poder de Satanás, eu afirmo o seu poder sobre mim por hoje, e quero que venha à mim agora. E tome posse do meu corpo como canal para o outro mundo". O resto está ilegível realmente.
- Bem parece que é só por a mão sobre essa pedra e tentar se comunicar com alguém.
Andy põe a mão sobre a de Tony. O tempo parece mudar de acordo com que os segundos voavam do relógio no braço esquerdo de Tony. Havia brisa suave sussurrando nos ouvidos dos garotos. A árvore atras deles não se mexia na brisa, nenhuma folha sequer. Frio toma conta de tudo, ao redor deles a temperatura deve ter baixado alguns graus, somente enquanto os dois casam as mãos uma em cima da outra.
- Tony, pode perguntar?
- Há alguém aqui? - A voz soa seca, ecoando no silêncio de uma falta de resposta. Parece que a voz foi até a parede de uma caverna; ecoando durante um tempo; mas voltando à eles logo depois. Cinco minutos se passam e o frio só fica mais ameaçador, e o vento aumenta, e a árvore.... Bem ela continua imóvel, nenhuma folha sequer...
- Tony, vamos embora, não há nada aqui.
- Espere. - hesita um pouco - Senhor Richard, Senhor Cliff Richards, está presente conosco?
O tempo realmente ficou mais seco, e os dois haviam percebido isso. A pressa de alguns segundos de Andy querendo ir embora foi silenciada por um desvio de olhar diretamente ao desenho do Sol em frente ao da Lua tornando-se viva, com seus raios se mexendo como tentáculos de um polvo.
A pedra se move em direção a palavra "Sim", e isso foi mais do que suficiente para uma resposta completa por um texto, mas sem nenhuma palavra.
- Tony, por favor me diga que você fez isso. - as mãos de Andrew tremem... Como no dia em que estava no balançador sendo empurrado por Darin Simmons, e foi tão alto que pulou do balanço de ferro, sendo mortal como um tiro para quebrar o pescoço de Darin e ele cair no chão como um saco de ossos sem vida - ANTONNY ME DIGA QUE FOI VOCÊ, NÃO BRINQUE COMIGO! EU CAI ESTÁ BEM, FOI ENGRAÇADO MAS ME DIGA QUE FOI VOCÊ!
Tony está calado, o seu silêncio responde que realmente ele não havia feito movimento algum.
Um órgão desafinado é tocado por alguém dentro de uniformes azuis, com um crachá escrito "Col. Forlowoods, Auxiliar de limpeza" e mais abaixo escrito:
"Auderan Cliff Lacroque Richards, qualquer dúvida pergunte a mim!"
Depois do nevoeiro o órgão é tocado mais depressa, e uma risada de uma cabeça em um dos grande tubos, o tubo central havia uma cabeça dando gargalhadas e gritando como um anunciador da morte:
- BEM VINDO AO JOGO!O JOGO É BEM VINDO! BEM VINDO AO JOGO!
O nevoeiro encobre a cena mais macabra na vida dos garotos, enquanto uma luz vai surgindo, uma salvação aparecendo, descendo a pequena ladeira a luz se transforma em duas, na verdade dois faróis com um acima colorido. Era um carro de polícia...
Uma sombra vai surgindo no meio do feixe de luz tampando um dos faróis, mas fazendo a mesma passar pelas suas costas, fazendo um desenho de asa de anjo em suas costas.
- Eu sou o comissário de polícia Norton, e esse comigo é o senhor MacKinny. Vocês devem ser Antonny e Andrew correto? o outro policial surge, mas está oculto pela luz forte do farol em cima dos garotos.
Antonny está calado, o medo derrama de seus olhos e de sua boca, o pavor de sua face é arrastado em memórias de quando era pequeno e tinha medo do escuro. Sempre que acordava no meio da madrugada, e sabia da escuridão que tomava conta do seu quarto voltava com a cabeça no cobertor cantarolando uma música ensinada pelo seu pai contra as trevas e a escuridão.
As únicas palavras de Tony naquele momento depois de Norton falar foi as mesmas frases daquela música infantil, recitada em um tom bem baixo como ele fazia quando criança, baixo para que o mal ocultado no escuro não o escute.
- Que a escuridão vá embora... Que o mal vá embora, e fique bem distante... Que quando eu abra os olhos e acorde não tenha mais nada, apenas forças na minha perna para que eu me levante...
Andrew olha para Tony e vê ele hipnotizado pelo rumo que aquilo tudo levou. Tony estava do lado dele, mas não estava certamente no mesmo tempo. O tempo que o levou para 6 anos de idade, em frente ao grande guarda-roupas de seu quarto, a porta entreaberta e grandes olhos o observando, como se soubesse que caminho tudo levaria, como se a morte dançasse sobre ele desde criança.
- Tony, consegue me ouvir?
A única resposta foi a pedra se mexer formando as palavras "S-E-M I-N-T-E-R-R-U-P-Ç-O-E-S".
E a árvore tomando vida, com olhos em seu tronco, e braços em seus galhos junto a alguns tentáculos da raiz se movendo até os policias. Tiros são dados, mas nenhum é tido como sucesso. As raízes sobem na perna do comissário agarrando em um de seus braços, ele luta usando toda sua força, tentando não deixar que seu dedo puxe o gatilho. É inevitável. O outro policial estava dependurado em um dos galhos com seus ossos sendo quebrados no ar, como bolachas crocantes na boca de um sedento por sangue, sedendo por vingança.
A pedra se move novamente formando a palavra "P-E-R-G-U-N-T-E", e daquele momento em diante apenas Andrew fez perguntas. Antonny permanecia em frente ao grande guarda-roupa dentro de sua cabeça, continuava preso em suas memórias.
- Eu quero sair agor... - é interrompido por uma sequência de movimentos fortes fazendo tremer violentamente o tabuleiro, até a pedra chegar a uma palavra "N-A-O", seguido de outras duas que diziam:"O-J-O-G-O N-A-O E A-S-S-I-M".
- Quem t-te ma-t-to-u? - diz com uma voz trêmula de alguém que não tinha tantas opções a não ser "jogar".
Não há resposta. O órgão é tocado, gritos de puberdade são ouvidos, mas a cidade permanece em silêncio. Parece não se importar.
Uma coruja nova que acabara de conhecer o mundo, olha atentamente a acentuação iluminada do cartaz dizendo "Aniversário do novo prefeito David Manson".
O quarto está uma bagunça, são 20:10 mas parece que Sr.Manson acabara de acordar de um sono de décadas. Um homem calvo, sempre foi assim. Alto, decaindo aquela barriga como bagagens de viagem. Viagens que por ele não teria ocorrido durante seu quinquagésimo quinto aniversário, está cansado para atender a porta, e quem bate? a velhice meu amigo.
A porta é escancarada com os passos largos até a cama, passos de um homem assustado.
- Senhor Manson, o que aconteceu?
- Bill...- ele boceja forte - por quê não bate na porta?
- Mas senhor, já são 20:40 e os convidados já estão todos no saguão.
- Ah, não... - avista o despertador distante acima do ombro esquerdo - oito e quarenta... Como pude dormir tanto?
- Preparo o smoking?
- Não está tudo bem, vou no banheiro lavar o rosto e desço. Peça aos garçons que distribuam as garrafas de Château Lafite Rothschild 1787 - fez questão de falar o nome da garrafa inteira - peça-os que faça isso já, quando descer espero vê-las nas mãos de todos os convidados.
- Sim Senhor! - diz Bill Bonno com uma de suas mãos escondida na toalha branca e a outra segurando a maçaneta para que o quarto entre em escuridão novamente.
Bill tinha o sonho de ser chefe de cozinha. Porém os tempos foram rudes com a família mudada da Itália para a "cidade de oportunidades de Four City", era assim que era divulgada em 1951 pelos rádios. Bill gostara da ideia de ser um mordomo, na verdade era uma necessidade e não definitivamente um gosto. Até que em 1956 alguém bateu em sua porta dizendo-lhe para trabalhar na mansão dos Caltons como cozinheiro( Logo depois tornou-se mordomo). Joe Calton, um velho freguês da rede de pizza e massas Bienvientinno foi quem lhe vez o pedido. Bill sabia que o negócio com as pizzas e massas não duraria tanto tempo assim, mas emprego na mansão era algo que podia durar até ele morrer.
Alguns meses se passaram e Joe havia morrido de velhice, a família decide se mudar vendendo a mansão para o antigo diretor do colégio de Forlowoods, e com a residência veio Bill.
- Senhor se me permite dizer, o senhor está ótimo! - exclama com um sorriso no rosto e uma postura ereta.
- Obrigado Bill.
Manson está na entrada do quarto com a porta entreaberta e um velho rádio tocando as músicas de Vera Lynn ecoando no corredor.
- Como estão os convidados, B?
- Estão esperando o senhor chegar.
A rádio troca de estação por conta própria.
- Bill, ainda não consertou esse rádio?
- Ele estava bem hoje de manhã, não sei o que houve.
Em voz estremecedora, a rádio recomeça em um volume muito alto fazendo várias pausas.
"E AGORA OS JOGOS DE VERÃO, TENDO COMO PRINCIPAL O COLÉGIO DE MAIS PONTOS NO ANO PASSADO... COLÉGIO FORLOWOODS... A ASSOCIAÇÃO DE TÉCNICOS DESIGNOU... SIM... ISSO MESMO.... CLIFF RICHARDS..."
David Manson ficou imediatamente pasmo. Seus olhos esbugalham como duas bolas de boliche. Seu coração entra em batidas baixas que ele mesmo consegue escutar. Sua voz de grossa e rouca de um homem velho solta apenas uma frase, apenas a força que teve para perguntar a Bill.
- Q-q-quem e-é o tre-tre-inador? - sua voz falha quase engasgando sua garganta em sua própria salivação
- O treinador é Scott Macbrian, o que se passa? o senhor em instantes ficou mais branco que o normal e suando também;Bill tira a mão a mão direita oculta na toalha que sempre levara até então e enxuga o suor de Manson; o senhor está gaguejando também, o que aconteceu?
- Scott? voc-cê disse Scott?
- Sim o nome do treinador, S-C-O-T-T - Bill soletra a primeira parte do nome e diz diretamente o segundo - Macbrian, Scott Macbrian, por quê o senhor o conhece?
- Sim achei que fosse um amigo do colegial - mente descaradamente mordendo seu lábio da parte inferior - eu realmente achei que fosse um amigo, bem eu me enganei não é?
Mas desde quando entrou pela porta daquela mansão um homem de terno não muito mais alto que ele, Bill sempre soubera quando ele mentia apesar de jamais tê-lo questionado.
- Então senhor, vamos descer? - retornando a toalha para cima do braço direito o ocultando novamente - as pessoas o esperam.
Recobrando as forças para voltar a falar em seu tom original.
- Vou dar um tempo por aqui, desço logo após..
- Sim senhor!
Bill dá as costas com receio de estar fazendo algo mal. Se insistisse um pouco mais. Se tentasse fazê-lo mudar de ideia ou perguntasse a razão do susto. Talvez fosse o caso de sua lealdade permanente que o obrigasse a sentar e roer o osso como um cão de guarda. Havia sido assim que o velho Calton morreu. Ele poderia ter morrido em casa na sua cama quente que toda sexta Bill esquentara, mas preferiu ir ao golfe com seu filho e apenas perceberam que durante a partida ele estava morto pelas tacadas acertadas Jason Calton que ele não havia comemorado junto, como sempre o fizera.
Em outra parte do corredor iluminada apenas pela luz emitente lua, escondido dos olhos de quem passasse por ali, há alguém pensando como uma mente psicopata. Os anos de terapia mental parecem ter ido embora somente naquela fração de segundos que o cordeiro se tornou um assassino. A gravata é re-ajustada para deixar o pescoço folgado. O cabelo calvo é posto para trás(alguns fiapos) da mesma forma que os ombros desajeitados da postura incorreta durante metade da vida.
As palavras aparentam sair das cordas vocais como se elas fossem um cipó repleto de espinhos atravessando a garganta até sair pela boca.
- Cliff...Cliff...Richards... Velho maldito. Sabia demais. - diz, alisando seus braços pelo calafrio que estivera ali enquanto se lembrava de uma cena que ocorreu há dois anos - EU TENTEI SUBORNA-LO - sua voz exalta-se seguida de uma risada macabra e um comentário sujo que apenas ele podia fazer naquele momento - HAHAHA...O velho já estava com o pé na cova, eu o fiz um favor. Realmente. Um favor. É. Favor. - a pausa do homem culpado pelo passado escondido no próprio medo. Os braços resplandecem na mesa próxima à janela. O olhar imóvel leva seus pensamentos a outra dimensão, um lado esquecido até então pelo fato em suas costas, o fato, sim, no passado. Onde o silêncio grita o seu nome, o "nada" o chama para participar também.
Mil novecentos e noventa e seis, um ano qualquer. Poderia ser, mas não é. Manson era um diretor, a escola estava indo muito bem financeiramente. David Manson era um homem justo até ser tomado de poder e mudar completamente. Era tarde e as cortinas brancas voavam e se entrelaçavam. Na sala da diretoria pedagógica, seis malas abertas nas mesas, cada uma com quinhentos mil. David não sabia que não estava sozinho. O dinheiro era reflexo dos lanches vendidos e algumas guloseimas patrocinadas por uma marca famosa, cinquenta por cento seria devolvido para a empresa, e a outra metade para pagar os gastos da semana de eventos de Forlowoods , arrecadando pontos de atividades extras para um bônus(sem preocupações em entrar para recuperação) de fim de ano para todos os aluno.Uma fuga dali para outro estado ou país seria um recomeço fantástico.
Removendo rapidamente como um lobo faminto dilacera a carne de uma presa. Atrás de Manson, um som de um esfregão roçando o chão molhado, molhado como o rosto escondido dentro de ternos negros e crachá de identificação escrito "David Manson Stuart - Diretoria Pedagógica".
A voz chega a dar calafrios;
- Senhor Manson? o que se passa?
Ele sabe quem disse isso, mas não responde ou vira o rosto até ele. Apenas estica o braço com algumas notas entrelaçadas em um elástico amarelo.
- Me perdoe, mas não. Não vi o que aconteceu. É suficiente.
O esfregão volta a arranhar o chão com fiapos de pano que pareciam unhas arranhando o quadro negro, que, pouco a pouco iam se distanciando e sumindo no largo corredor.
Os nós de três dedos da mão esquerda são batidos na porta de madeira do compartimento de limpezas da escola. Há um homem grisalho guardando produtos de limpeza em prateleiras, preparando-se para ir embora.
- Senhor Richards, as dobradiças da janela do sétimo ano estão com problemas - uma voz grossa e rouca travada pelo acontecimento anterior.
- Eu as verifiquei ontem a noite, como podem dar defeito uma hora dessas?
- Bem... Eu não sei...mas é... Apenas não funcionam - o frio já cobre sua espinha por completo, como a água gelada cedo de manhã, quando parece que a companhia de água resolve pôr pedras de gelo no reservatório.
- Eu vou verificar, as janelas da sétima, no andar de cima correto?
Ele trava um pouco em responder a fim de ter uma pausa para pensar um final mais trágico, realmente as janelas de cima poderiam dar a ele um voo de 15 metros e uma aterrissagem como um saco de adubo para as plantas do jardim do colégio.
- Isso, lá em cima... Lá no alto.
Os dois homens sobem cada degrau, um querendo ajudar e o outro rindo por dentro. A cada passo Cliff estava se aproximando da morte, chegando perto da maluquice de um homem que só passaria a pensar nele mesmo. Os passos são ocos de sapatos sociais e um par de botas de borracha. Elas rangem e rangem gritando por ajuda, e os sapatos respondem no mesmo tom "ninguém pode ouvi-las aqui mocinhas".
- Onde está a janela?
A visão revela que já está quase na hora.
- A do meio, essa do meio.
As dobradiças da janela do colégio ( a sétima séria especificamente) não foram reformadas e permanecem a mesma desde sua construção. As dobradiças eram viradas para fora, que era um perigo eminente para quem as fechava, tendo de puxar por fora as dobradiças e ir soltando aos poucos para fecha-las para dentro. Talvez foram feitas por algum arquiteto brigado com a mulher e com vários problemas financeiros, talvez tenha sido feito depressa por alguém que só pensava em dinheiro, alguém bêbado ou drogado, como eu disse... Talvez.
- Não estou encontrando problema aqui senhor Manson, têm certeza que é essa?
- Sim, examine a segunda dobradiça. E você verá.
O corpo de Manson estava em um ângulo perfeito, suas duas pernas para dentro e do tronco acima para fora. As janelas antigas de ferro iriam parti-lo no meio, um Grand Finale fabuloso e melhor do que vê-lo despencar de 15 metros como um saco de merda. Até pensou na desculpa "acidentes acontecem... Cliff estava velho, talvez eu deveria estar na hora, um homem bom não merecia morrer dessa forma, minhas sinceras condolências", perfeito.
No exato momento de executar, faltou-lhe força, elas desvaiam de seu corpo em direção ao chão até perder-las. Faltou um empurrãozinho "dinheiro, rico, longe desse inferno", palavras-chave, era isso.
Ele se aproxima como um lobo em busca da presa, à espreita apenas no momento certo ataca-lo, recorrendo a um chute no meio das pernas, o fazendo escorregar um pouco para baixo, deixando sua cabeça para um alvo fácil. Seu corpo subiu pendurado-se nas frestas da janela com seu peso em cima do corpo. Fazendo Richards, ou o que sobrava dele, se debater parecido com uma galinha decepada.
Um metro e oitenta escondido em ternos negros que estavam com respingos de sangue, alisando os cabelos calvos e os puxando para trás, fixando-os com os restos de sangue que ficaram em suas mãos ao se apoiar em cima dele.
Pássaros voam para o sul, trazendo de volta a realidade.
- Aquele velho não pode estar vivo. É coisa da minha cabeça. Uma barata vive sem cabeça durante alguns dias, mas aquele velho? Já fazem alguns anos.
- Senhor Manson? - Bill verificara todos os quartos do corredor até encontrar um homem em pé com os braços esticados em uma mesinha de costas para o corredor, onde a luz bate mais fraca - Senhor Manson! os convidados o esperam, eles se questionam dizendo que não viera a festa. O que eu falo?
- Me acompanhe Bill! - sua voz está calma, mas seu rosto soa muito. E novamente Bill tirara a toalha de seu braço pra lhe enxugar todo o rosto, mantendo-lhe a boa aparência.
David acha que bebendo poderá apagar um pouco a memória do dia, uma garrafa após a outra no desespero fulminado pela ânsia de que o Sol chegue no outro dia recomeçando o que ainda lhe restara de vida. As horas voam no antigo relógio de mesa deixado ali por décadas desde o primeiro morador da mansão. Pessoas vão e outras permanecem com seus assuntos de negócios, outras ainda dançam.
E David? bebe e bebe o sangue derramado do vinho direto na taça de sua vida, é uma dança também, um gesto macabro ativo na dança, dançando com a morte diretamente para o seu fim.
São 1:32, todos já têm saído da mansão. Apenas David e Bill.
- Senhor, posso preparar sua cama?
- Não Bill, Tudo bem eu vou sozinho.
- Às ordens!
Dezesseis garrafas de vinho espalhadas pelo chão sendo juntadas por Bill, enquanto o passo bêbado cambaleante sobe as escadas de uma maneira rápida. Era apenas se deitar em seu quarto e esperar pelo Sol.
Os passos vão ficando cada vez maiores, mas David está parado. Uma bola é rolada do quarto de hóspedes até seus pés. Duas crianças com fardas escolares (Um tênis social, uma blusa de gola, e shorts) escrito no seus versos " Time de Futebol Forlowoods - TFF". Cada um escrito acima do número 13 e 31 "Andrew" e "Antonny". Sim os garotos desaparecidos, onde até hoje seus nomes estão estampados em caixas de leite com número de telefones de seus pais. Ele avança o passo para o quarto e evita olhar aquela cena por mais alguns segundos.
- David... David? - Uma voz produzida por uma sombra sentada no mesmo lugar que se encontrara lembrando do assassinato. Uma voz fria porém velha. Um pouco mais que ele. Um flash de relâmpago de uma chuva que estaria por vir revela apenas o corpo, mas sem a cabeça.
- Richards? não pode ser você, eu devo ter bebido demais.
- Oh sim você bebeu, e isso facilitou as coisas, por quê não verifica a janela, amigo?
Manson se vira para a janela de um dos quartos antes do seu. Sua porta estava aberta e dava para ver claramente além das lamparinas à velas, uma sombra cobria toda sua janela. Relâmpagos são soltados como flashes de câmeras fotográficas. A sombra do galho rastejando em sua janela. Em todas na verdade.
- E agora, o que vêm depois? amigo, você arrancou minha cabeça e vim cobrar a dívida e vim buscar seu coração!
- Eu tenho dinheiro...Eu pago o quanto for preciso... Quanto quer, me diga? - Abre sua carteira e deixa cair notas de cem e várias moedas rolam pelo chão também.
- Ah você vai pagar o que é necessário sim. Nós não aceitamos seu dinheiro aqui Manson.
Uma das raízes agarra sua perna e o arrasta lentamente para o escuro. David arranha o chão, arranha com força na falha chance de tentar se agarrar em alguma coisa. Mas é impossível. Seu corpo se debate como uma galinha decepada, do mesmo jeito que Richards fizera. Uma das raízes entra pelo seu umbigo e a outra na boca. Seus olhos se encontram esbugalhados e seu nariz escorre secreções.
- Isso David, sofra, sofra meu amigo, afunde na sua própria luxúria. O inferno preparou algo especial para você!
A pele do seu peitoral é dilacerado com um galho da árvore, seu coração é encontrado em meio aos ossos que fazem do peitoral um baú, entre as veias e artérias. O seu coração pulsa, mas David ainda está vivo.
- Muito bem David, não morra agora. Espere mais um pouco. - a voz gelada e sombria se dissipa no ar. Longe dali no andar debaixo, um órgão é tocado em alta escala sonora. Ninguém o toca. David está deitado em sua cama com os braços abertos da forma que Jesus morreu. Sua cabeça está baixa. Ele está despido. Todas suas roupas estão fielmente dobradas. Há alguém enforcado no jardim com uma toalha branca. Um homem de terno. O mordomo. O órgão toca uma última música na sinfonia maestral da trágica noite. Não há ninguém na banqueta a não ser um coração pulsante de um para seis, e de seis para um... até... finalmente... morrer...
- A Árvore negra...
- COM UM PODER A MIM CONCEDIDO EU INVOCO VOCÊ!
- Deixa de ser otário, virou padre? e não aqueles exorcistas e sim aqueles que fazem casamento.
- É brincadeira, eu vou ler as instruções aqui atrás, está tudo escrito de forma estranha.
- Tenta esfregar que nem a lâmpada do Aladdin.
- Vou esfregar na sua bunda, que nem o cacete do Tony, ops meu.
- Mais uma eu vou embora...
- Cara então não fala besteira. Bem vamos lá está tudo em negrito e está quase ilegível...
- Me dá isso deixa que eu leio!
Antonny tira da bolsa uma última peça que viera com o tabuleiro, uma pedra cinza em forma de coração com um buraco no meio.
- Que troço sinistro, está tudo em alemão...
- Como você sabe?
- Morei lá com meu pai até ele morrer, depois vim morar com minha mãe.
- E então, o que está escrito?
- "Für die Kräfte, die in der Finsternis herrschen, und die frühen Morgenstunden, der Macht des Satans, ich behaupte, seine Macht über mich jetzt, und ich möchte mich jetzt kommen. Und in Besitz nehmen meinen Körper als Kanal zur anderen Welt ".
- Pode me dizer o que significa na minha língua, por favor? - diz em um tom irônico e pouco irritado
- Diz:"Pelas forças que prevalecem nas trevas, e as primeiras horas da manhã, no poder de Satanás, eu afirmo o seu poder sobre mim por hoje, e quero que venha à mim agora. E tome posse do meu corpo como canal para o outro mundo". O resto está ilegível realmente.
- Bem parece que é só por a mão sobre essa pedra e tentar se comunicar com alguém.
Andy põe a mão sobre a de Tony. O tempo parece mudar de acordo com que os segundos voavam do relógio no braço esquerdo de Tony. Havia brisa suave sussurrando nos ouvidos dos garotos. A árvore atras deles não se mexia na brisa, nenhuma folha sequer. Frio toma conta de tudo, ao redor deles a temperatura deve ter baixado alguns graus, somente enquanto os dois casam as mãos uma em cima da outra.
- Tony, pode perguntar?
- Há alguém aqui? - A voz soa seca, ecoando no silêncio de uma falta de resposta. Parece que a voz foi até a parede de uma caverna; ecoando durante um tempo; mas voltando à eles logo depois. Cinco minutos se passam e o frio só fica mais ameaçador, e o vento aumenta, e a árvore.... Bem ela continua imóvel, nenhuma folha sequer...
- Tony, vamos embora, não há nada aqui.
- Espere. - hesita um pouco - Senhor Richard, Senhor Cliff Richards, está presente conosco?
O tempo realmente ficou mais seco, e os dois haviam percebido isso. A pressa de alguns segundos de Andy querendo ir embora foi silenciada por um desvio de olhar diretamente ao desenho do Sol em frente ao da Lua tornando-se viva, com seus raios se mexendo como tentáculos de um polvo.
A pedra se move em direção a palavra "Sim", e isso foi mais do que suficiente para uma resposta completa por um texto, mas sem nenhuma palavra.
- Tony, por favor me diga que você fez isso. - as mãos de Andrew tremem... Como no dia em que estava no balançador sendo empurrado por Darin Simmons, e foi tão alto que pulou do balanço de ferro, sendo mortal como um tiro para quebrar o pescoço de Darin e ele cair no chão como um saco de ossos sem vida - ANTONNY ME DIGA QUE FOI VOCÊ, NÃO BRINQUE COMIGO! EU CAI ESTÁ BEM, FOI ENGRAÇADO MAS ME DIGA QUE FOI VOCÊ!
Tony está calado, o seu silêncio responde que realmente ele não havia feito movimento algum.
Um órgão desafinado é tocado por alguém dentro de uniformes azuis, com um crachá escrito "Col. Forlowoods, Auxiliar de limpeza" e mais abaixo escrito:
"Auderan Cliff Lacroque Richards, qualquer dúvida pergunte a mim!"
Depois do nevoeiro o órgão é tocado mais depressa, e uma risada de uma cabeça em um dos grande tubos, o tubo central havia uma cabeça dando gargalhadas e gritando como um anunciador da morte:
- BEM VINDO AO JOGO!O JOGO É BEM VINDO! BEM VINDO AO JOGO!
O nevoeiro encobre a cena mais macabra na vida dos garotos, enquanto uma luz vai surgindo, uma salvação aparecendo, descendo a pequena ladeira a luz se transforma em duas, na verdade dois faróis com um acima colorido. Era um carro de polícia...
Uma sombra vai surgindo no meio do feixe de luz tampando um dos faróis, mas fazendo a mesma passar pelas suas costas, fazendo um desenho de asa de anjo em suas costas.
- Eu sou o comissário de polícia Norton, e esse comigo é o senhor MacKinny. Vocês devem ser Antonny e Andrew correto? o outro policial surge, mas está oculto pela luz forte do farol em cima dos garotos.
Antonny está calado, o medo derrama de seus olhos e de sua boca, o pavor de sua face é arrastado em memórias de quando era pequeno e tinha medo do escuro. Sempre que acordava no meio da madrugada, e sabia da escuridão que tomava conta do seu quarto voltava com a cabeça no cobertor cantarolando uma música ensinada pelo seu pai contra as trevas e a escuridão.
As únicas palavras de Tony naquele momento depois de Norton falar foi as mesmas frases daquela música infantil, recitada em um tom bem baixo como ele fazia quando criança, baixo para que o mal ocultado no escuro não o escute.
- Que a escuridão vá embora... Que o mal vá embora, e fique bem distante... Que quando eu abra os olhos e acorde não tenha mais nada, apenas forças na minha perna para que eu me levante...
Andrew olha para Tony e vê ele hipnotizado pelo rumo que aquilo tudo levou. Tony estava do lado dele, mas não estava certamente no mesmo tempo. O tempo que o levou para 6 anos de idade, em frente ao grande guarda-roupas de seu quarto, a porta entreaberta e grandes olhos o observando, como se soubesse que caminho tudo levaria, como se a morte dançasse sobre ele desde criança.
- Tony, consegue me ouvir?
A única resposta foi a pedra se mexer formando as palavras "S-E-M I-N-T-E-R-R-U-P-Ç-O-E-S".
E a árvore tomando vida, com olhos em seu tronco, e braços em seus galhos junto a alguns tentáculos da raiz se movendo até os policias. Tiros são dados, mas nenhum é tido como sucesso. As raízes sobem na perna do comissário agarrando em um de seus braços, ele luta usando toda sua força, tentando não deixar que seu dedo puxe o gatilho. É inevitável. O outro policial estava dependurado em um dos galhos com seus ossos sendo quebrados no ar, como bolachas crocantes na boca de um sedento por sangue, sedendo por vingança.
A pedra se move novamente formando a palavra "P-E-R-G-U-N-T-E", e daquele momento em diante apenas Andrew fez perguntas. Antonny permanecia em frente ao grande guarda-roupa dentro de sua cabeça, continuava preso em suas memórias.
- Eu quero sair agor... - é interrompido por uma sequência de movimentos fortes fazendo tremer violentamente o tabuleiro, até a pedra chegar a uma palavra "N-A-O", seguido de outras duas que diziam:"O-J-O-G-O N-A-O E A-S-S-I-M".
- Quem t-te ma-t-to-u? - diz com uma voz trêmula de alguém que não tinha tantas opções a não ser "jogar".
Não há resposta. O órgão é tocado, gritos de puberdade são ouvidos, mas a cidade permanece em silêncio. Parece não se importar.
"Os corpos estão desaparecidos, as fotos são postas por toda a cidade, alguém sabe onde raios essas pessoas foram parar? Caso encontrem liguem... - Assim dizia o noticiário das nove, uma semana depois. Três anos se arrastam nas mentes abaladas das mães e pais, três longos anos avançam no chão gelado da calada cidade"
Uma coruja nova que acabara de conhecer o mundo, olha atentamente a acentuação iluminada do cartaz dizendo "Aniversário do novo prefeito David Manson".
O quarto está uma bagunça, são 20:10 mas parece que Sr.Manson acabara de acordar de um sono de décadas. Um homem calvo, sempre foi assim. Alto, decaindo aquela barriga como bagagens de viagem. Viagens que por ele não teria ocorrido durante seu quinquagésimo quinto aniversário, está cansado para atender a porta, e quem bate? a velhice meu amigo.
A porta é escancarada com os passos largos até a cama, passos de um homem assustado.
- Senhor Manson, o que aconteceu?
- Bill...- ele boceja forte - por quê não bate na porta?
- Mas senhor, já são 20:40 e os convidados já estão todos no saguão.
- Ah, não... - avista o despertador distante acima do ombro esquerdo - oito e quarenta... Como pude dormir tanto?
- Preparo o smoking?
- Não está tudo bem, vou no banheiro lavar o rosto e desço. Peça aos garçons que distribuam as garrafas de Château Lafite Rothschild 1787 - fez questão de falar o nome da garrafa inteira - peça-os que faça isso já, quando descer espero vê-las nas mãos de todos os convidados.
- Sim Senhor! - diz Bill Bonno com uma de suas mãos escondida na toalha branca e a outra segurando a maçaneta para que o quarto entre em escuridão novamente.
Bill tinha o sonho de ser chefe de cozinha. Porém os tempos foram rudes com a família mudada da Itália para a "cidade de oportunidades de Four City", era assim que era divulgada em 1951 pelos rádios. Bill gostara da ideia de ser um mordomo, na verdade era uma necessidade e não definitivamente um gosto. Até que em 1956 alguém bateu em sua porta dizendo-lhe para trabalhar na mansão dos Caltons como cozinheiro( Logo depois tornou-se mordomo). Joe Calton, um velho freguês da rede de pizza e massas Bienvientinno foi quem lhe vez o pedido. Bill sabia que o negócio com as pizzas e massas não duraria tanto tempo assim, mas emprego na mansão era algo que podia durar até ele morrer.
Alguns meses se passaram e Joe havia morrido de velhice, a família decide se mudar vendendo a mansão para o antigo diretor do colégio de Forlowoods, e com a residência veio Bill.
- Senhor se me permite dizer, o senhor está ótimo! - exclama com um sorriso no rosto e uma postura ereta.
- Obrigado Bill.
Manson está na entrada do quarto com a porta entreaberta e um velho rádio tocando as músicas de Vera Lynn ecoando no corredor.
- Como estão os convidados, B?
- Estão esperando o senhor chegar.
A rádio troca de estação por conta própria.
- Bill, ainda não consertou esse rádio?
- Ele estava bem hoje de manhã, não sei o que houve.
Em voz estremecedora, a rádio recomeça em um volume muito alto fazendo várias pausas.
"E AGORA OS JOGOS DE VERÃO, TENDO COMO PRINCIPAL O COLÉGIO DE MAIS PONTOS NO ANO PASSADO... COLÉGIO FORLOWOODS... A ASSOCIAÇÃO DE TÉCNICOS DESIGNOU... SIM... ISSO MESMO.... CLIFF RICHARDS..."
David Manson ficou imediatamente pasmo. Seus olhos esbugalham como duas bolas de boliche. Seu coração entra em batidas baixas que ele mesmo consegue escutar. Sua voz de grossa e rouca de um homem velho solta apenas uma frase, apenas a força que teve para perguntar a Bill.
- Q-q-quem e-é o tre-tre-inador? - sua voz falha quase engasgando sua garganta em sua própria salivação
- O treinador é Scott Macbrian, o que se passa? o senhor em instantes ficou mais branco que o normal e suando também;Bill tira a mão a mão direita oculta na toalha que sempre levara até então e enxuga o suor de Manson; o senhor está gaguejando também, o que aconteceu?
- Scott? voc-cê disse Scott?
- Sim o nome do treinador, S-C-O-T-T - Bill soletra a primeira parte do nome e diz diretamente o segundo - Macbrian, Scott Macbrian, por quê o senhor o conhece?
- Sim achei que fosse um amigo do colegial - mente descaradamente mordendo seu lábio da parte inferior - eu realmente achei que fosse um amigo, bem eu me enganei não é?
Mas desde quando entrou pela porta daquela mansão um homem de terno não muito mais alto que ele, Bill sempre soubera quando ele mentia apesar de jamais tê-lo questionado.
- Então senhor, vamos descer? - retornando a toalha para cima do braço direito o ocultando novamente - as pessoas o esperam.
Recobrando as forças para voltar a falar em seu tom original.
- Vou dar um tempo por aqui, desço logo após..
- Sim senhor!
Bill dá as costas com receio de estar fazendo algo mal. Se insistisse um pouco mais. Se tentasse fazê-lo mudar de ideia ou perguntasse a razão do susto. Talvez fosse o caso de sua lealdade permanente que o obrigasse a sentar e roer o osso como um cão de guarda. Havia sido assim que o velho Calton morreu. Ele poderia ter morrido em casa na sua cama quente que toda sexta Bill esquentara, mas preferiu ir ao golfe com seu filho e apenas perceberam que durante a partida ele estava morto pelas tacadas acertadas Jason Calton que ele não havia comemorado junto, como sempre o fizera.
Em outra parte do corredor iluminada apenas pela luz emitente lua, escondido dos olhos de quem passasse por ali, há alguém pensando como uma mente psicopata. Os anos de terapia mental parecem ter ido embora somente naquela fração de segundos que o cordeiro se tornou um assassino. A gravata é re-ajustada para deixar o pescoço folgado. O cabelo calvo é posto para trás(alguns fiapos) da mesma forma que os ombros desajeitados da postura incorreta durante metade da vida.
As palavras aparentam sair das cordas vocais como se elas fossem um cipó repleto de espinhos atravessando a garganta até sair pela boca.
- Cliff...Cliff...Richards... Velho maldito. Sabia demais. - diz, alisando seus braços pelo calafrio que estivera ali enquanto se lembrava de uma cena que ocorreu há dois anos - EU TENTEI SUBORNA-LO - sua voz exalta-se seguida de uma risada macabra e um comentário sujo que apenas ele podia fazer naquele momento - HAHAHA...O velho já estava com o pé na cova, eu o fiz um favor. Realmente. Um favor. É. Favor. - a pausa do homem culpado pelo passado escondido no próprio medo. Os braços resplandecem na mesa próxima à janela. O olhar imóvel leva seus pensamentos a outra dimensão, um lado esquecido até então pelo fato em suas costas, o fato, sim, no passado. Onde o silêncio grita o seu nome, o "nada" o chama para participar também.
Mil novecentos e noventa e seis, um ano qualquer. Poderia ser, mas não é. Manson era um diretor, a escola estava indo muito bem financeiramente. David Manson era um homem justo até ser tomado de poder e mudar completamente. Era tarde e as cortinas brancas voavam e se entrelaçavam. Na sala da diretoria pedagógica, seis malas abertas nas mesas, cada uma com quinhentos mil. David não sabia que não estava sozinho. O dinheiro era reflexo dos lanches vendidos e algumas guloseimas patrocinadas por uma marca famosa, cinquenta por cento seria devolvido para a empresa, e a outra metade para pagar os gastos da semana de eventos de Forlowoods , arrecadando pontos de atividades extras para um bônus(sem preocupações em entrar para recuperação) de fim de ano para todos os aluno.Uma fuga dali para outro estado ou país seria um recomeço fantástico.
Removendo rapidamente como um lobo faminto dilacera a carne de uma presa. Atrás de Manson, um som de um esfregão roçando o chão molhado, molhado como o rosto escondido dentro de ternos negros e crachá de identificação escrito "David Manson Stuart - Diretoria Pedagógica".
A voz chega a dar calafrios;
- Senhor Manson? o que se passa?
Ele sabe quem disse isso, mas não responde ou vira o rosto até ele. Apenas estica o braço com algumas notas entrelaçadas em um elástico amarelo.
- Me perdoe, mas não. Não vi o que aconteceu. É suficiente.
O esfregão volta a arranhar o chão com fiapos de pano que pareciam unhas arranhando o quadro negro, que, pouco a pouco iam se distanciando e sumindo no largo corredor.
Os nós de três dedos da mão esquerda são batidos na porta de madeira do compartimento de limpezas da escola. Há um homem grisalho guardando produtos de limpeza em prateleiras, preparando-se para ir embora.
- Senhor Richards, as dobradiças da janela do sétimo ano estão com problemas - uma voz grossa e rouca travada pelo acontecimento anterior.
- Eu as verifiquei ontem a noite, como podem dar defeito uma hora dessas?
- Bem... Eu não sei...mas é... Apenas não funcionam - o frio já cobre sua espinha por completo, como a água gelada cedo de manhã, quando parece que a companhia de água resolve pôr pedras de gelo no reservatório.
- Eu vou verificar, as janelas da sétima, no andar de cima correto?
Ele trava um pouco em responder a fim de ter uma pausa para pensar um final mais trágico, realmente as janelas de cima poderiam dar a ele um voo de 15 metros e uma aterrissagem como um saco de adubo para as plantas do jardim do colégio.
- Isso, lá em cima... Lá no alto.
Os dois homens sobem cada degrau, um querendo ajudar e o outro rindo por dentro. A cada passo Cliff estava se aproximando da morte, chegando perto da maluquice de um homem que só passaria a pensar nele mesmo. Os passos são ocos de sapatos sociais e um par de botas de borracha. Elas rangem e rangem gritando por ajuda, e os sapatos respondem no mesmo tom "ninguém pode ouvi-las aqui mocinhas".
- Onde está a janela?
A visão revela que já está quase na hora.
- A do meio, essa do meio.
As dobradiças da janela do colégio ( a sétima séria especificamente) não foram reformadas e permanecem a mesma desde sua construção. As dobradiças eram viradas para fora, que era um perigo eminente para quem as fechava, tendo de puxar por fora as dobradiças e ir soltando aos poucos para fecha-las para dentro. Talvez foram feitas por algum arquiteto brigado com a mulher e com vários problemas financeiros, talvez tenha sido feito depressa por alguém que só pensava em dinheiro, alguém bêbado ou drogado, como eu disse... Talvez.
- Não estou encontrando problema aqui senhor Manson, têm certeza que é essa?
- Sim, examine a segunda dobradiça. E você verá.
O corpo de Manson estava em um ângulo perfeito, suas duas pernas para dentro e do tronco acima para fora. As janelas antigas de ferro iriam parti-lo no meio, um Grand Finale fabuloso e melhor do que vê-lo despencar de 15 metros como um saco de merda. Até pensou na desculpa "acidentes acontecem... Cliff estava velho, talvez eu deveria estar na hora, um homem bom não merecia morrer dessa forma, minhas sinceras condolências", perfeito.
No exato momento de executar, faltou-lhe força, elas desvaiam de seu corpo em direção ao chão até perder-las. Faltou um empurrãozinho "dinheiro, rico, longe desse inferno", palavras-chave, era isso.
Ele se aproxima como um lobo em busca da presa, à espreita apenas no momento certo ataca-lo, recorrendo a um chute no meio das pernas, o fazendo escorregar um pouco para baixo, deixando sua cabeça para um alvo fácil. Seu corpo subiu pendurado-se nas frestas da janela com seu peso em cima do corpo. Fazendo Richards, ou o que sobrava dele, se debater parecido com uma galinha decepada.
Um metro e oitenta escondido em ternos negros que estavam com respingos de sangue, alisando os cabelos calvos e os puxando para trás, fixando-os com os restos de sangue que ficaram em suas mãos ao se apoiar em cima dele.
Pássaros voam para o sul, trazendo de volta a realidade.
- Aquele velho não pode estar vivo. É coisa da minha cabeça. Uma barata vive sem cabeça durante alguns dias, mas aquele velho? Já fazem alguns anos.
- Senhor Manson? - Bill verificara todos os quartos do corredor até encontrar um homem em pé com os braços esticados em uma mesinha de costas para o corredor, onde a luz bate mais fraca - Senhor Manson! os convidados o esperam, eles se questionam dizendo que não viera a festa. O que eu falo?
- Me acompanhe Bill! - sua voz está calma, mas seu rosto soa muito. E novamente Bill tirara a toalha de seu braço pra lhe enxugar todo o rosto, mantendo-lhe a boa aparência.
David acha que bebendo poderá apagar um pouco a memória do dia, uma garrafa após a outra no desespero fulminado pela ânsia de que o Sol chegue no outro dia recomeçando o que ainda lhe restara de vida. As horas voam no antigo relógio de mesa deixado ali por décadas desde o primeiro morador da mansão. Pessoas vão e outras permanecem com seus assuntos de negócios, outras ainda dançam.
E David? bebe e bebe o sangue derramado do vinho direto na taça de sua vida, é uma dança também, um gesto macabro ativo na dança, dançando com a morte diretamente para o seu fim.
São 1:32, todos já têm saído da mansão. Apenas David e Bill.
- Senhor, posso preparar sua cama?
- Não Bill, Tudo bem eu vou sozinho.
- Às ordens!
Dezesseis garrafas de vinho espalhadas pelo chão sendo juntadas por Bill, enquanto o passo bêbado cambaleante sobe as escadas de uma maneira rápida. Era apenas se deitar em seu quarto e esperar pelo Sol.
Os passos vão ficando cada vez maiores, mas David está parado. Uma bola é rolada do quarto de hóspedes até seus pés. Duas crianças com fardas escolares (Um tênis social, uma blusa de gola, e shorts) escrito no seus versos " Time de Futebol Forlowoods - TFF". Cada um escrito acima do número 13 e 31 "Andrew" e "Antonny". Sim os garotos desaparecidos, onde até hoje seus nomes estão estampados em caixas de leite com número de telefones de seus pais. Ele avança o passo para o quarto e evita olhar aquela cena por mais alguns segundos.
- David... David? - Uma voz produzida por uma sombra sentada no mesmo lugar que se encontrara lembrando do assassinato. Uma voz fria porém velha. Um pouco mais que ele. Um flash de relâmpago de uma chuva que estaria por vir revela apenas o corpo, mas sem a cabeça.
- Richards? não pode ser você, eu devo ter bebido demais.
- Oh sim você bebeu, e isso facilitou as coisas, por quê não verifica a janela, amigo?
Manson se vira para a janela de um dos quartos antes do seu. Sua porta estava aberta e dava para ver claramente além das lamparinas à velas, uma sombra cobria toda sua janela. Relâmpagos são soltados como flashes de câmeras fotográficas. A sombra do galho rastejando em sua janela. Em todas na verdade.
- E agora, o que vêm depois? amigo, você arrancou minha cabeça e vim cobrar a dívida e vim buscar seu coração!
- Eu tenho dinheiro...Eu pago o quanto for preciso... Quanto quer, me diga? - Abre sua carteira e deixa cair notas de cem e várias moedas rolam pelo chão também.
- Ah você vai pagar o que é necessário sim. Nós não aceitamos seu dinheiro aqui Manson.
Uma das raízes agarra sua perna e o arrasta lentamente para o escuro. David arranha o chão, arranha com força na falha chance de tentar se agarrar em alguma coisa. Mas é impossível. Seu corpo se debate como uma galinha decepada, do mesmo jeito que Richards fizera. Uma das raízes entra pelo seu umbigo e a outra na boca. Seus olhos se encontram esbugalhados e seu nariz escorre secreções.
- Isso David, sofra, sofra meu amigo, afunde na sua própria luxúria. O inferno preparou algo especial para você!
A pele do seu peitoral é dilacerado com um galho da árvore, seu coração é encontrado em meio aos ossos que fazem do peitoral um baú, entre as veias e artérias. O seu coração pulsa, mas David ainda está vivo.
- Muito bem David, não morra agora. Espere mais um pouco. - a voz gelada e sombria se dissipa no ar. Longe dali no andar debaixo, um órgão é tocado em alta escala sonora. Ninguém o toca. David está deitado em sua cama com os braços abertos da forma que Jesus morreu. Sua cabeça está baixa. Ele está despido. Todas suas roupas estão fielmente dobradas. Há alguém enforcado no jardim com uma toalha branca. Um homem de terno. O mordomo. O órgão toca uma última música na sinfonia maestral da trágica noite. Não há ninguém na banqueta a não ser um coração pulsante de um para seis, e de seis para um... até... finalmente... morrer...
- A Árvore negra...
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